
A geomorfologia e a constituição geológica associadas ao clima, conferem características muito peculiares à serra algarvia, pouco comparáveis a outras regiões bio-climáticas mundiais. Outros factores, porém individualizam esta região geográfica, desde logo, a cultura muito própria das suas gentes, fruto de um isolamento ditado pela languidez temporal.
Entre o Barrocal (faixa calcária entre o litoral e a serra) e a peneplanície alentejana, a leste da Serra de Monchique ergue-se a Serra do Caldeirão. Constituída por altitudes pouco vigorosas que em poucos lugares ultrapassam os 500 metros, os cerros arredondados, a densidade de rede hidrográfica, os vales encaixados, em forma de V, mas contudo, pouco profundos, acentuam as características geomeorfológicas genuínas desta região remotamente comparável a uma pequena área do nordeste transmontano, curiosamente, também pertencente ao mesmo Maciço e por conseguinte de formação geológica idêntica.
A serra do Caldeirão (fronteira meridional do Maciço Antigo) é em toda a sua extensão constituída por solos xistosos-grauvaques, e xistosos-argilosos, o que torna o chão pobre, de camada arável fina e por conseguinte pouco fértil, o suficiente para a esteva espontaneamente e indiscriminadamente cobrir toda a sua extensão.
As urzes, os medronheiros, a palmeira anã e a aroeira, assim como a azinheira e o sobreiro também têm aqui lugar; associadas a outras árvores de fruto das quais o homem, desde que ocupa este território e as transpôs para aqui tem sabido tirar partido para a sua sobrevivência.
A amendoeira espalhada pelas vertentes de declive suave, a oliveira predominantemente instalada nos vales, junto a linhas de água, (barrancos e ribeiras) assim como as alfarrobeiras e ainda outras de árvores como a laranjeira, ou a nespereira, preferencialmente cultivadas na horta, sempre contribuíram para a sobrevivência dos homens da serra.
O clima ameno de tipo mediterrâneo individualiza-se aqui, fruto de um maior afastamento relativamente ao mar. As temperaturas máximas e mínimas sofrem ligeiras alterações relativamente às que ocorrem no litoral e a precipitação fruto da maior altitude relativa também aqui é maior, sendo contudo fraca e não excedendo em média os 800 mm anuais, diminuindo de Oeste para Leste. Todavia, a importância da serra sobre o clima do litoral é marcante, visto que esta funciona como um estorvo à passagem dos ventos mais frescos que sopram do quadrante Norte e é também uma barreira às depressões que se acercam do quadrante Noroeste no Outono e na Primavera, amenizando assim o clima do barrocal e do litoral algarvio.
Face à adversidade do relevo, “o serrenho” (o homem da serra assim denominado na faixa litoral) soube adaptar-se e vencer os naturais constrangimentos. Nos vales menos encaixados, junto a linhas de água temporárias, abriu poços, aplanou o terreno e construiu as suas hortas que lhe dão os primores de cada estação (as batatas: alimento insubstituível, as favas, e outros legumes sazonais). Nas encostas plantou os cereais: o trigo para o seu pão, o centeio, a cevada, o tremoço, a aveia para a ração dos seus animais que desempenham um papel importantíssimo de ajuda nas tarefas agrícolas. O pequeno rebanho de cabras ou de ovelhas constitui-se como uma ajuda à frágil economia familiar, enquanto que o gado asinino e equino foi o que teve um papel de relevância na lavoura e no transporte do próprio homem, assim como dos sues víveres e haveres.
O povoamento é concentrado em pequenos “montes” (núcleos urbanos) dispersos pela serra, em rechãs, em pertelas ou em vales onde o relevo é menos vigoroso e onde a água está proxima.
As casas de xisto reboacadas com cal, barro e areia e caiadas de branco, de telhado de madeira e canas sob telhas de argila extravasam para a rua. O acesso às poucas dependências faz-se pela rua. A “casa do fogo”, porque ali, tradicionalmente, se fazia o fogo para o aquecimento nas noites de Inverno e para cozinhar todos os dias do ano, é a casa de recepção por excelência, aqui se come se recebe, se está, e se vive e se convive. As outras dependências “a casa de fora” e os quartos são reservados às famílias e apenas servem, respectivamente, como dispensa para os cereais e como dormitório: a mobília é simples e parca.